Nestes primeiros capítulos do livro a autora fala sobre as questões voltadas para a teoria e prática da abordagem humanista-fenomenológica. Segundo ela “teoria e prática existem em mútua constituição” (p.20), assim como o homem e o mundo.
Diante desse ponto fundamental da mútua constituição é importante nesta abordagem a “descrição do homem no mundo, da realidade vivida, da experiência.” (p.21). Essa realidade deve ser descrita e não analisada, nem explicada, pois ela já está dada. É nessa descrição do paciente, que o método fenomenológico é necessário para a apreensão da realidade humana. Como a autora afirma “apreender o significado da experiência, função da intuição eidética é justamente um dos objetivos da psicoterapia.” (p.63)
E, para que ocorra uma certa apreensão deste significado é indispensável que a teoria que me guia, meus conceitos e opiniões sejam postos em parênteses, e não sejam negados. É importante sabermos que essa redução fenomenológica não é atingida em sua completude.
Segundo Moreira “somente através da descrição e compreensão desta realidade humana estaremos trabalhando para uma articulação entre teoria e prática (...).” (p.23)
A autora ainda afirma que “Husserl criou a fenomenologia enquanto um método descritivo que tinha como objetivo ‘voltar às coisas mesmas’ – o fenômeno – realizando, assim, uma crítica à ciência positivista que priorizava o uso da razão.” (p.28). Essa fenomenologia, “como método de pesquisa transcendental proposto por Husserl, assume, pela primeira vez, um caráter existencial em Heidegger, com sua filosofia ontológica do ser-no-mundo. (…). Esse caráter existencial, trazido por Heidegger para o seio da fenomenologia, encontra-se radicalizado no pensamento de Merleau-Ponty, que vai além, tratando não mais de um homem no mundo, mas de um homem mundano”(p.28)
Rogers tinha uma visão mais antropocêntrica do conceito de homem, na qual o homem era visto como centro de tudo. E, vimos nestes capítulos que essa proposta fenomenológica vem para mostrar esse homem numa perspectiva mundana, em mútua constituição com o mundo e vice-versa, numa visão mais antropológica em oposição ao antropocentrismo de Rogers. Diante disso, Merleau-Ponty desenvolveu, uma fenomenologia mundana como uma ferramenta crítica, sendo mais do que um método.
Essa proposta abole o homem como ser dicotomizado e, propõe que o homem seja mundo e que o mundo seja homem. “Este homem, que sempre está entrelaçado com o mundo, não é o centro do mundo. Ele o constituiu tanto quanto o mundo constitui a ele, de tal modo que não existe um centro.” (p. 39)
Essas propostas do método fenomenológico de Merleau-Ponty tratam de “buscar o significado da experiência vivida, ou seja, compreender o Lebenswelt, o mundo vivido” (p.51), do cliente. E, isso se desenvolve no processo psicoterapêutico na intersecção dos Lebenswelten do terapeuta e do cliente. Sendo isso possível por meio da empatia.
Ou seja, todos nós estamos em mútua constituição com tudo que está em nossa volta por mais simples que algo possa ser. O “setting terapêutico, na psicoterapia humanista-fenomenológica, está estabelecido de tal forma que paciente e terapeuta se possam ver e ouvir simultaneamente.” (p. 69). É nesta simultaneidade que nos constituímos como seres humanos incluídos dentro de uma sociedade, dentro de uma cultura e de uma estrutura posta pela comunidade. Vivemos em um sistema, na qual jamais poderemos ser vistos de uma forma individual, pois tudo está interligado. Por mais que a sociedade de hoje esteja caminhando cada vez mais para a individualidade, mais ela está interligada ao todo, pois é o todo que está induzindo essa pessoa à individualidade, no sentido da grande quantidade de coisas a fazer e se dedicar que foram impostas pela sociedade que estamos incluídos.
Resumindo, todos nós somos e fazemos parte de um sistema, de um todo, e constituídos seja de forma boa ou ruim, direta ou indireta. Mas, estamos.
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